segunda-feira, 8 de novembro de 2010

O medo que gera violência


Texto I: A Morte do Leiteiro (Drummond)


A Cyro Novaes
Há pouco leite no país,
é preciso entregá-lo cedo.
Há muita sede no país,
é preciso entregá-lo cedo.
Há no país uma legenda,
que ladrão se mata com tiro.
Então o moço que é leiteiro
de madrugada com sua lata
sai correndo e distribuindo
leite bom para gente ruim.
Sua lata, suas garrafas
e seus sapatos de borracha
vão dizendo aos homens no sono
que alguém acordou cedinho
e veio do último subúrbio
trazer o leite mais frio
e mais alvo da melhor vaca
para todos criarem força
na luta brava da cidade.
Na mão a garrafa branca
não tem tempo de dizer
as coisas que lhe atribuo
nem o moço leiteiro ignaro,
morador na Rua Namur,
empregado no entreposto,
com 21 anos de idade,
sabe lá o que seja impulso
de humana compreensão.
E já que tem pressa, o corpo
vai deixando à beira das casas
uma apenas mercadoria.
E como a porta dos fundos
também escondesse gente
que aspira ao pouco de leite
disponível em nosso tempo,
avancemos por esse beco,
peguemos o corredor,
depositemos o litro...
Sem fazer barulho, é claro,
que barulho nada resolve.
Meu leiteiro tão sutil
de passo maneiro e leve,
antes desliza que marcha.
É certo que algum rumor
sempre se faz: passo errado,
vaso de flor no caminho,
cão latindo por princípio,
ou um gato quizilento.
E há sempre um senhor que acorda,
resmunga e torna a dormir.
Mas este acordou em pânico
(ladrões infestam o bairro),
não quis saber de mais nada.
O revólver da gaveta
saltou para sua mão.
Ladrão? se pega com tiro.
Os tiros na madrugada
liquidaram meu leiteiro.
Se era noivo, se era virgem,
se era alegre, se era bom,
não sei,
é tarde para saber.
Mas o homem perdeu o sono
de todo, e foge pra rua.
Meu Deus, matei um inocente.
Bala que mata gatuno
também serve pra furtar
a vida de nosso irmão.
Quem quiser que chame médico,
polícia não bota a mão
neste filho de meu pai.
Está salva a propriedade.
A noite geral prossegue,
a manhã custa a chegar,
mas o leiteiro
estatelado, ao relento,
perdeu a pressa que tinha.
Da garrafa estilhaçada,
no ladrilho já sereno
escorre uma coisa espessa
que é leite, sangue... não sei.
Por entre objetos confusos,
mal redimidos da noite,
duas cores se procuram,
suavemente se tocam,
amorosamente se enlaçam,
formando um terceiro tom
a que chamamos aurora.



Texto II:  Arma de fogo e raiva transformam empresário em assassino

Adão Barbosa ainda não sabia, mas a decisão de comprar uma arma por R$ 500,00 em 2005 mudaria a vida dele e tiraria a de outra pessoa, três anos depois.
Sem porte de arma, o empresário da construção civil explica que comprou o revólver como forma de defesa, jamais imaginou que tivesse que usá-lo, mas matou ontem o pedreiro Francisco dos Santos da Silva, no bairro Canguru.
Barbosa conta que deixou-se levar pelo nervosismo durante um protesto na Rua Katinguá. Os moradores haviam fechado a via em manifestação contra a violência no trânsito. "Fiquei com medo, cercaram o carro, quebraram os vidros de uma caminhonete. Disse que iria atirar para o chão, nem vi onde acertei", recorda emocionado.
O comerciante explicou que até a tarde de ontem desconhecia os motivos do protesto. Também não conhecia Francisco dos Santos Silva, de 37 anos, o pedreiro que ele matou.
Pai de três filhos, Barbosa deseja o impossível: "voltar no tempo", e conforma-se apenas em imaginar como seria o encontro com a família do pedreiro morto. "Eu pediria desculpas, muita, muita, muita".
Manifestação - As pessoas que participaram do protesto na noite de terça reivin dicavam uma lombada eletrônica como forma de reduzir a velocidade dos carros na via, depois que três acidentes assustaram os moradores.
Apesar da tentativa de conter a violência no trânsito, e pela paz, acabaram presenciando um assassinato.
Hoje, mais um acidente mostrou que os morador es têm motivo para prot estar. Ou tra co lisão deixou uma mulher ferida.
Ana Macedo, 39 anos, foi socorrida pelo Samu (Serviço Móvel de Atendimento de Urgência), mas o motociclista que a atropelou fugiu.

Fonte: Campo Grande News

Interpretação


Texto I:


1. Você acha justa a afirmação de que “ladrão se mata com tiro”? Quais os prós e contras desta afirmação?


2. Embora o leiteiro procurasse entregar o leite de modo a não fazer barulho, de vez em quando topava com vários        obstáculos, interrompendo o silêncio. Cite alguns.

3. “E há sempre um senhor que acorda, resmunga e volta a dormir.” Por que naquela madrugada um morador acordou em pânico?

               4. Que expressão mostra que o morador pegou o revólver com rapidez e sem pensar no que estava fazendo?

              5. O homem se sentiu culpado pela atitude impensada que tomou? Que frases ou expressões comprovam isso?

6.  O texto explora a temática do medo da violência das cidades. A expressão "luta brava da cidade" faz referência a que elementos e situações da vida moderna?

7. No momento da morte do leiteiro, o leite (branco) mistura-se com o sangue (vermelho) criando uma nova tonalidade, que representa a cor da aurora. O que a imagem deste amanhecer representa no final do texto?


                 Texto II:


             8. O Texto II é fição (invenção) ou realidade? Justifique sua resposta.

             9. Qual é o objetivo deste texto: informar ou entreter?

10. Um protesto contra violência no trânsito acabou gerando um caso de morte. Isto aconteceu por quê? Que motivos levaram o empresário a usar sua arma?






Agora é um ótimo momento para sistematizar as características da linguagem poética (Texto I) e da linguagem jornalística (Texto II). Vamos preencher o quadro abaixo refletindo sobre as diferenças e semelhanças existentes entre os dois textos:


Diferenças

Texto I
Texto II














Semelhanças





Um comentário:

  1. Que lindo teu blog.
    Muitas ideias, muita criatividade!
    Parabéns e sucesso!
    Cristiane
    http://rovedacris.wordpress.com

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